“E a culpa não era minha, nem onde estava, nem como me vestia. O estuprador era você. O estuprador é você”

O título desse texto nos remete a dois acontecimentos importantes na luta contra a violência contra a mulher. De um lado, ele tem como base uma performance do Coletivo feminista Lastesis, do Chile, intitulada “Um estuprador em seu caminho”. Por outro lado, a performance repercute como resultado do combate à violência contra a mulher, exatamente no dia 25 de novembro, considerado o Dia Internacional da Eliminação da Violência contra as Mulheres.

E é exatamente no mês de novembro que presenciamos mais um ataque às mulheres no Brasil. A violência, já nossa conhecida no cotidiano e na luta, toma uma nova forma. O Estado, por meio da Justiça e seus agentes, inocenta um estuprador utilizando de um recurso mais que grotesco:  “estupro culposo”. Esse termo surge nas redes sociais a partir da ideia da afirmação em processo que o estuprador não tinha a intenção de estuprar.

O caso de Mariana Ferrer e seus algozes vem repercutindo nacional e internacionalmente dada as diversas formas de violência sofridas pela jovem. Ela não só fora estuprada pelo empresário André de Camargo Aranha, mas sofreu abusos por parte dos advogados, do promotor e do juiz, diante não apenas da absolvição do criminoso, mas principalmente, pela humilhação a que fora submetida durante a audiência.

Essa situação pede a toda sociedade que se levante urgentemente contra a absolvição, a sentença e todos os seus agentes. Pede mais ainda, que lutemos por justiça por Mariana Ferrer e por todas as mulheres que sofrem e sofreram violência. Não é possível naturalizar a cultura do estupro, é preciso combatê-la veementemente.

Indignadas, revoltadas e repletas de energia para a luta, um grupo de mulheres de Maceió decidiu não ficar de braços cruzados diante de tamanha barbárie. Elas iniciaram como um grupo de amigas dispostas a fazerem uma intervenção e para além do seu controle, como uma grande corrente de indignação e solidariedade, o movimento cresceu e se transformou num grande ato que está sendo organizado por elas, por diversas forças e por coletivos feministas. De acordo com Marynara Santos, estudante de pedagogia da UFAL e uma das organizadoras do ato: “Tudo teve início quando eu e meu grupo de amigas começamos a discutir sobre a nossa revolta por todo o caso de Mariana Ferrer. A nossa indignação foi tão grande que decidimos por conta própria mandar fazer uma faixa para erguer na passarela da UFAL. Então, criamos um grupo no WhatsApp e começamos a divulgar no Instagram e Twitter para quem quisesse contribuir com o ato. No entanto, a proporção do movimento foi crescendo mais que o esperado e conseguimos lotar 3 (três) grupos de WhatsApp até o momento. Quando vimos que estava tomando tamanha proporção começamos a contatar grupos que pudessem contribuir com nosso movimento”

Importante lembrar que esses movimentos se espalharam por todo o Brasil e diversos atos irão ocorrer em defesa de Mariana Ferrer e contra a violência contra a mulher. O movimento se autointitula a partir de uma tag: #naruapormarianaferrer. Conforme ainda Marynara, o movimento em Maceió está articulado com o nacional: “Consegui entrar no grupo nacional que está organizando atos pelo país inteiro. Nós estamos muito orgulhosas com tanta gente que vai às ruas reivindicarem nossos direitos”. Junto a ela, estão Heloize Lopes, Rany Costa e Bruna Rocha.

É preciso lembrar o quanto é importante essa luta coletiva, partindo de uma união de mulheres e com o apoio de toda a sociedade. Afinal, dados recentes do Anuário Brasileiro de Segurança Púbica sobre violência sexual apontam que “temos um estupro a cada 8 minutos”, sendo 70% das vítimas adolescentes e crianças, e a maior parte dos agressores são pessoas próximas. As leis são frágeis e a nossa luta ainda é imensa para que essa situação seja revertida. Se o caso de Mari Ferrer chegou nesse nível, suponhamos a força da violência sobre mulheres pobres, periféricas, principalmente, as negras. É por todas as mulheres que devemos estar nas ruas nesse sábado, dia 07 de novembro.

Não esqueçamos de todo o histórico de luta dos movimentos feministas e suas organizações para refrear a barbárie e impedir o avanço cada vez maior dos retrocessos perpetrados pelo próprio Estado brasileiro. Lembremos das nossas lutas mais recentes para garantir o direito do aborto por estupro de uma menina de 10 anos, mais comum do que supomos em nosso país. Colecionamos as dores de todas as meninas e mulheres, mas delas transformamos combustível para a luta.

Encerramos esse texto convidando a todas e todos para somarem ao ato. Concentração no CEPA, as 14h. E assim finalizamos nossa indignação e revolta com o trecho da música, tão pertinente para os dias que correm e que seja a denúncia necessária para a luta:

“E a culpa não era minha, nem onde estava, nem como me vestia.

O estuprador era você. O estuprador é você.

São os policiais,

os juízes,

o estado,

o Presidente.

O Estado opressor é um macho estuprador”.

 

 

Andréa Moraes – Diretora de Formação Política do Sintietfal

Maceió, 04 de novembro de 2020.

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