Nota Pública sobre os riscos para Educação Pública mediante agenda neoliberal no contexto da Pandemia Covid-19

Vivenciamos um cenário gravíssimo, sem igual na história da humanidade e, particularmente, no Brasil. De um lado, enfrentamos uma pandemia ocasionada por um novo vírus, o Sars-Cov-2, popularmente conhecido como Coronavírus, aumentando todos os dias os números de infectados e de mortos. Por outro, sociedades no mundo inteiro têm sofrido as consequências nefastas do sistema capital e de governos com suas agendas econômicas neoliberais que aprofundam cada vez mais as desigualdades sociais, resultando em fome, violência, precarização do trabalho, doenças endêmicas entre outras questões.

No Brasil, já vínhamos enfrentando um conjunto feroz de ataques dessa agenda neoliberal com a retirada de direitos sociais, trabalhistas, previdenciários e o congelamento dos investimentos públicos, por 20 anos, principalmente nas áreas da saúde e da educação. Como sempre, o alvo desses retrocessos é a classe trabalhadora, em detrimento do mercado financeiro, de investidores e das corporações nacionais e internacionais.

Considerando o cenário global de luta pela vida contra os avanços da COVID-19 e as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) para o isolamento social, como medida preventiva mais acertada, nos preocupa as movimentações equivocadas do Ministério da Educação (MEC), aproveitando-se do cenário que nos encontramos, para implementar a utilização do Ensino a Distância (EAD) nas diversas modalidades de ensino, sem restrições, especialmente atingindo a Educação Básica.

A Educação a Distância sem distinção e critérios pedagógicos sérios deve ser questionada, pois a imensa maioria dos estudantes das escolas públicas são de famílias carentes, sem acesso a itens básicos de alimentação, higiene e até mesmo água potável ou saneamento básico. Logo, essas famílias não possuem condições de comprar computadores, contratar serviços de internet, ou dispor de um ambiente adequado para os estudos, por vezes compartilham com outros membros da família o mesmo espaço físico. Outro aspecto grave é que na prática a criança ou o(a) adolescente tem a responsabilidade de aprender sozinho, apenas sendo o receptor da informação.

De maneira que pensarmos a EAD na educação básica é destruir a relação pedagógica e humanística entre o professor e o estudante, esse ainda em fase de maturação de visão de mundo e de sua personalidade. É justamente nesse momento que este indivíduo necessita de referências  humanas, acadêmicas, orientações psicopedagógicas, laços fraternos que o inspiram durante sua formação. É igualmente comprometido o rico convívio pedagógico desse estudante com seus colegas  e demais atores presentes na vida escolar. Sem a rica convivência plural na sala de aula, nos grupos de leitura, na biblioteca,  na interação das equipes na quadra esportiva,  o despertar dos talentos artísticos no palco, a surpresa dos experimentos científicos nos laboratórios ou ainda a rica experiência nos estudos de campo. A EAD não condiz com o universo da educação básica, de um público juvenil ainda em processo das  elaborações simbólicas mais complexas no que diz respeito à linguagem, às leituras do mundo, as inter-relações humanas, a construção da empatia e a compreensão  da realidade que o cerca a partir da interação coletiva.

A realidade socioeducacional de Alagoas reflete os contrastes do Brasil e atesta a inviabilidade da EAD na escola pública, especialmente na Educação Básica. O Estado ocupa a última colocação no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), 19º lugar nos anos iniciais, no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) e o 20º lugar nos anos finais do ensino fundamental conforme dados recentes do IBGE. No que se refere a renda per capita domiciliar mensal, Alagoas ocupa o 26º lugar. Tais dados evidenciam a necessidade urgente e primordial de mais investimentos no setor educacional e na melhora da qualidade de vida de milhares de alagoanos.

Não somos, a princípio, contra as atividades educacionais não presenciais mediadas pelas tecnologias digitais, ao contrário, entendemos ser um instrumento importante no processo ensino-aprendizagem, no entanto são apenas suporte e auxílio. Mediante os múltiplos perfis das sociedades  contemporâneas, os recursos digitais e eletrônicos, se corretamente utilizados possibilita o alcance e possibilidades de formação a inúmeros  perfis de estudantes.

Nesses tempos de isolamentos,  as tecnologias digitais são importantes  aliadas para todos nós, dentro das possibilidades de acesso dos nossos discentes, são ferramentas  que possibilitam o acompanhamento psicopedagógico e de atividades educacionais para manter o vínculo com a instituição,  com os seus respectivos cursos de formação, o acesso a conteúdos, o contato com o professor, e as múltiplas formas de exploração do mundo digital. Uma característica das gerações atuais, e um desafio para inclusão efetiva de muitos desses jovens a esses recursos.

Por fim, gostaríamos de convidar todas e todos para uma reflexão: O mundo está mergulhado na pior crise econômica da história e para garantir a continuidade desse sistema cruel, o capitalismo vai precisar avançar até locais e setores antes pouco explorados e a Educação Básica é um destes setores. E o meio mais eficaz de transformar essa esfera da vida em mercadoria é justamente oferecendo sistemas de ensino online, a exemplo da empresa Kroton, prestadora de serviços de tecnologia para escolas e faculdades, que tornou-se, recentemente uma holding chamada Cogna Educação e da Fundação Lemann, que buscam avidamente por lucros, desejando explorar a Educação básica nas redes públicas de ensino.

Reside aí, o perigo de um modelo educacional em EAD como substituto das atividades presenciais e, portanto, dos professores. E o resultado desse movimento é o esvaziamento do trabalho docente, restando apenas alguns sobreviventes, com a função de tutores. Serão igualmente atingidos os demais profissionais do corpo técnico administrativo, pedagógico, e, sobretudo, os alunos.

A precarização da formação humana, educacional e profissional dos filhos da classe trabalhadora é um projeto em curso que precisamos combater.

Lutemos! Agora, depois e sempre!

Diretoria Executiva do Sintietfal

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